Fabrício Rosa propõe ações de atenção à saúde mental de pessoas dependentes de jogos de azar
O vereador Fabrício Rosa (PT) apresentou, nesta semana, projeto de lei que prevê a criação da Política Municipal de Atenção à Saúde Mental de Pessoas com Transtornos Associados à Dependência em Jogos de Azar – a ludopatia – em Goiânia. A principal preocupação da proposta se dá pelo avanço dos problemas relacionados a jogos e a apostas eletrônicas – as bets. O projeto de lei 641/2025 estabelece princípios, diretrizes e formas de atuação intersetorial; autoriza a celebração de parcerias; e propõe a realização de campanhas educativas.
A ludopatia é reconhecida como transtorno mental e comportamental pelos principais sistemas classificatórios (CID-10, CID-11, DSM), com evidências consistentes de associação a endividamento grave, conflitos familiares, depressão, ideação e tentativa de suicídio, perda de emprego e vulnerabilidades sociais. Estudos e notas técnicas recentes no Brasil apontam que o ambiente digital, com acesso 24 horas, rapidez de transações, bônus agressivos, anonimato relativo e forte apelo publicitário, aumenta o risco de uso compulsivo e dificulta o controle individual.
O vereador lembra que levantamento técnico do Banco Central do Brasil e análises subsequentes indicam a movimentação de bilhões de reais em apostas on-line, o que inclui montantes expressivos oriundos de beneficiários de programas de transferência de renda, como o Bolsa Família, “o que evidencia deslocamento de recursos essenciais para o consumo de apostas e aprofunda a vulnerabilidade de famílias de baixa renda”.
Para Fabrício Rosa, esses dados dialogam com outros encontrados ao redor do mundo a respeito dos problemas de saúde mental causados pelas bets, como os relatórios da Lancet Public Health Commission on Gambling, “que defendem tratar o jogo problemático como tema de saúde pública, demandando políticas específicas de prevenção, regulação de estímulos e oferta de cuidado acessível”.
Segundo o parlamentar, embora a Lei 14.790/2023 e outras normas federais tenham disciplinado a exploração das apostas de quota fixa, essa regulamentação não afasta a responsabilidade municipal de organizar sua Rede de Atenção Psicossocial para acolher pessoas com transtornos decorrentes do jogo; de desenvolver campanhas educativas e ações preventivas em escolas, unidades de saúde e territórios vulneráveis; e de articular saúde, assistência social e educação na proteção de pessoas e de famílias afetadas.
PL 641/2025
Em seu artigo 1º, a proposta estabelece que fica instituída, em Goiânia, a Política Municipal de Atenção à Saúde Mental de Pessoas com Transtornos Associados à Dependência em Jogos de Azar (ludopatia), com fundamento nos princípios do Sistema Único de Saúde (SUS) e da Rede de Atenção Psicossocial (Raps).
Para isso, devem ser observados os seguintes princípios.
- reconhecimento da ludopatia como questão de saúde pública e como problema de alta relevância social;
- integralidade, continuidade e humanização do cuidado;
- intersetorialidade entre saúde, assistência social, educação, esporte, cultura, direitos humanos e juventude;
- respeito à dignidade, à autonomia e à confidencialidade das pessoas atendidas;
- promoção da equidade, com atenção especial a populações vulnerabilizadas;
- atuação baseada em evidências científicas e em boas práticas nacionais e internacionais.
Ludopatia
De acordo com o PL 641/2025, "entende-se por ludopatia o transtorno de comportamento caracterizado por padrão persistente e recorrente de jogo ou de aposta, preferencialmente em dinheiro, com perda de controle sobre a atividade e sobre a manutenção do comportamento, apesar de prejuízos pessoais, familiares, sociais ou financeiros, nos termos das classificações diagnósticas reconhecidas (CID-10, CID-11 e manuais internacionais)”.
Entre os objetivos previstos pela Política Municipal de Atenção à Saúde Mental de Pessoas com Transtornos Associados à Dependência em Jogos de Azar, estão:
- prevenir, identificar precocemente e enfrentar transtornos associados ao uso problemático de jogos de azar, de apostas eletrônicas e de correlatos;
- garantir acolhimento, acompanhamento, tratamento e reinserção social de pessoas com ludopatia, no âmbito da Rede de Atenção Psicossocial (Raps) e de outros serviços do SUS;
- desenvolver campanhas educativas contínuas sobre riscos e sobre impactos econômicos, sociais e psicológicos de apostas e de jogos de azar, com ênfase nas plataformas digitais;
- qualificar profissionais de saúde, de educação e de assistência social para identificação, abordagem e encaminhamento adequado dos casos;
- fomentar ações específicas voltadas à proteção de crianças, de adolescentes e de jovens, prevenindo a exposição precoce e a normalização das apostas;
- estimular a produção, a sistematização e a divulgação de dados e de estudos sobre ludopatia em Goiânia, resguardados o sigilo e a proteção de dados pessoais.
Diretrizes do PL 641/2025
O projeto estabelece diretrizes a serem seguidas pela Política Municipal, como a inserção das ações no âmbito da Rede de Atenção Psicossocial, em articulação com a Atenção Primária à Saúde, com os Centros de Atenção Psicossocial (Caps), com serviços especializados e com a rede de urgência e emergência; além da prioridade a estratégias de cuidado em liberdade, territoriais e comunitárias, com enfoque em prevenção, em redução de danos e no fortalecimento de vínculos familiares e sociais.
O texto também prevê a integração com a rede de assistência social, formada pelos Cras, Creas, Centros POP e entidades parceiras, para suporte a famílias em situação de vulnerabilidade, superendividamento ou ruptura de vínculos; a articulação com a Rede Municipal de Ensino, para ações educativas sobre jogo responsável, finanças pessoais e riscos da dependência em apostas, respeitada a autonomia pedagógica e as normativas educacionais; e o estímulo à criação de fluxos de referência e de contrarreferência entre saúde, assistência e justiça, para casos graves ou com risco associado à violência, ao endividamento extremo ou à violação de direitos.
Implementação da Política Municipal
A Política Municipal de Atenção à Ludopatia poderá ser implementada pelo Poder Executivo por meio de ações e de programas desenvolvidos pelas secretarias competentes, especialmente as de Saúde, Assistência Social, Educação, Esporte, Cultura, Direitos Humanos e Juventude.
De acordo com o projeto, ficará a cargo da Prefeitura de Goiânia estabelecer protocolos clínicos, linhas de cuidado e fluxos de atendimento no âmbito da Raps e da Atenção Primária à Saúde; promover campanhas educativas em escolas, unidades de saúde, equipamentos públicos e meios de comunicação institucionais; e ofertar formação continuada para profissionais da rede pública.
A proposta também autoriza o Executivo a firmar convênios, termos de colaboração, acordos de cooperação e parcerias com instituições públicas e privadas, universidades, conselhos profissionais, organizações da sociedade civil e organismos nacionais ou internacionais que atuem na prevenção, no tratamento, na pesquisa ou na reinserção social de pessoas com ludopatia, observada a legislação aplicável (em especial a Lei Federal 13.019/2014), que estabelece o regime jurídico de parcerias entre administração pública e organizações da sociedade civil.
Ainda de acordo com o texto, a Prefeitura de Goiânia poderá divulgar, em relatórios públicos, informações consolidadas sobre ações, atendimentos e resultados da Política Municipal, com indicadores de cobertura e de impacto, vedada a identificação individual de usuários. “O tratamento de dados decorrentes da execução desta Lei observará a Lei Federal 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais), garantindo-se finalidade específica, minimização, segurança e anonimização sempre que possível”, afirma a matéria.
Despesas da Política Municipal de Atenção à Ludopatia
As despesas decorrentes da execução da Lei serão custeadas por dotações orçamentárias próprias, que poderão ser suplementadas, se necessário, respeitadas as limitações da Lei de Responsabilidade Fiscal. “Fica o Poder Executivo autorizado a regulamentar esta Lei, no que couber, definindo atribuições dos órgãos envolvidos, fluxos assistenciais, protocolos, indicadores e estratégias de integração intersetorial, sem criação de novos cargos ou de estruturas permanentes.”
De acordo com Fabrício Rosa, a proposta foi apresentada e construída com rigor jurídico para não invadir a competência da União (que regula a atividade econômica das apostas) nem a competência organizacional da Prefeitura. “Não se criam cargos, não se impedem estruturas administrativas, não se intervém na gestão interna de secretarias”, observou o vereador.
Fabrício Rosa explica que o projeto limita-se a instituir princípios e diretrizes de uma política pública indispensável, que reconhece a ludopatia como questão de saúde mental relevante em Goiânia. A proposta autoriza a implementação de ações de prevenção, de cuidado e de reinserção, bem como a celebração de parcerias com instituições especializadas e a integração das ações à Raps, à Atenção Primária e à rede socioassistencial, o que fortalece fluxos já existentes, sem sobreposição normativa.
“Trata-se, portanto, de medida fundamentada e socialmente necessária, que responde à expansão das apostas on-line e de seus impactos na saúde mental e na economia familiar; que oferece instrumentos para prevenção e cuidado, em consonância com o SUS; que respeita a autonomia federativa e a reserva de iniciativa do Executivo; e que reforça o compromisso da Câmara de Goiânia com a proteção da saúde, da família, da juventude e das populações vulneráveis”, concluiu Fabrício Rosa.












